Páginas

Seguidores

terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

O Advogado (causo)



                                           



         
  Numa cidade pacata do interior morava um senhor, na verdade uma figura folclórica, dessas raridades que não é qualquer cidade pequena que existe. Eu era novata, tinha um pequeno comércio, um empório de secos e molhados, muito comum naquele tempo. Tanto vendia o pão nosso de cada dia, como a bebida nossa de cada dia, levada ou bebida no balcão, em especial as alcoólicas.
            Ali, era um ponto de encontro de trabalhadores ao final da tarde,  como : boias frias , sitiantes, tocadores de viola(foi assim que passei  à apreciar a música raiz) velhos contadores de causos e os chamados “vagabundos farrapos humanos”que vinham filar uma dose  e muitas vezes implorar um gole de uma “branquinha”. Uns ainda conseguia ir chutando para casa, outros davam trabalho, caia na calçada, ali ficava, até achar um compadecido que o levantasse e induzisse ao seu recanto, sabe lá, aquele recanto de rua, pois era ali que morava.
         Entre tantos causos contados, um me chamou atenção, bem antes de conhecê-lo.O Sr  Luis  Alberto, que de tanto ouvir falar nele pelos os frequentadores  assíduos do meu estabelecimento. Foi assim que  aquela história chegou aos meus ouvidos aguçados, dia a dia como capítulos de novela . Cada vez que eu servia um trago e debruçava sobre o balcão, acompanhava atenta a conversa
      Assim cada um deles contava um pedaço da história e outro confirmava dando veracidade ao causo. Ele, veio de uma família tradicional no ramo de fazenda de gado no Oeste paulista, era o caçula de cinco irmãos, logo que terminou os estudos secundário, foi enviado para  universidade da capital e de lá só saiu formado em advocacia.
       Depois de formado, retornou para fazenda e pediu que o pai lhe abrisse um escritório.. O pai rejeitou a ideia, disse que o queria exclusivamente para  advogar os seus bens, cuidar do interesse da fazenda, ele não aceitou...
       Começou a se meter com farras, bebidas, mulheres meretrizes, como a mesada que o pai ainda lhe dava. Inconformado, o seu genitor cansado de brigas, chamar a sua atenção, vendo que nada resolvia, o chamou para uma conversa séria e deu o veredicto final: 

 -- De hoje em diante, você vai trabalhar para sustentar seus vícios e suas mulheres. Vou lhe montar um escritório e este, vai ser sua herança e ponto final, esqueça de uma vez por toda que você teve uma família.
    Assim o pai fez. Montou um escritório de advocacia no centro da cidade, ele prosperou n por um bom tempo, era o advogado conceituado, querido por todos, até tinha fugido aparentemente dos seus vícios, a bebida e mulheres. Conheceu uma jovem decente, em menos de um ano, namorou, casou e desse casamento teve duas filhas. Com o passar do tempo, bebendo ora aqui, ora ali socialmente, teve uma recaída no vício do álcool, razão pela qual não combinava nada com sua carreira, nem a família aceitava.
Ele for ficando desacreditado, começou a perder clientela, destruiu a sua família, a mulher foi embora com outro e as duas filhas ainda de menor.
  Luís Alberto caiu em desgraça, e quanto mais caía, mais clientes perdia. Vendeu tudo o que tinha conseguido, inclusive o escritório, para  poder se manter, mas foi se entregando de corpo e alma a bebida, as meretrizes. Sem perceber, já estava na dura vida de sarjeta, um mendigo, um farrapo humano, um ébrio. Nas poucas horas que estava sóbrio, fazia questão de andar sem rumo pra e pra com a única coisa que lhe sobrara, uma pasta de couro surrada, trajado de paletó, gravata amassado e rasgado,todo roto, falava alto:
-- Eu sou o Luís Alberto, o advogado!
 E o povo caçoava:
-- Lá vai o Luisinho
  com sua malinha e sua lancheira para o jardim da infância.

      (Dora Duarte) Florianópolis, 22/02/2016.

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2016

Antigo sonho (relato)



 



         Não sei por que cargas  d) água me veio esta música , vejo meus dedos deslizando no teclado a tocar justamente àquela que ouvi no sonho pesadelo num passado remoto  . Já toquei de ouvidos outras clássicas, porém, esta... Deve haver alguma explicação que não estar no meu alcance de entender. (Serenata de Schubert), ela é linda, mas, chega a me arrepiar quando a escuto. Por que fui lembrar disso agora?  Pensando bem, eu me impressiono a toa. Aqui relato o sonho que tive, faz muito tempo, mas, eu me lembro como se fosse ontem.

        Isto aconteceu no meado dos anos 70. Adormeci como de costume naquele sono profundo, sim porque quando eu era jovem tinha um sono pesado,era uma pedra na cama dormindo, nem me lembro se fui dormir contrariada, ou não, muito menos conhecia a música, mal a ouvi no rádio, nem simpatia por ela eu tinha.
           Então, sonhei que eu estava dentro de uma cemitério,  tentava achar a saída, mas não conseguia, era como se eu tivesse ido ao algum enterro, e me perdia das pessoas. Começava  a ventar forte, as árvores  balançava feito bailarinas, o vento assoviava e eu correndo sem muita direção. Eis que de repente ouvi àquela melodia, era numa voz meia sussurrada , ouvi bem  a letra daquela música. As minhas lágrimas brotaram nos olhos, apenas, ouvia e chorava,..
A música é Serenata, versão em português.

Vamos amor
Que em nosso jardim
A flor já desabrochou
Vamos seguir
A estrada feliz
Que a mão de Deus nos traçou

O luar virá depois
Iluminar nós dois
Nós dois e mais ninguém
O teu sonho velarei
Teus olhos beijarei
Para sonhar também

          Noutra ocasião, novamente um sonho semelhante, também dentro de um cemitério parecia o mesmo, era um jardim imenso e eu escutava  ao longe àquela doce melodia, chovia fino e ventava. E esta música a original é com o cantor Demis Roussos, na real, eu adorava as músicas dele, principalmente Goodbye my Love”,”Rain and tears” nem tanto, porém, foi  exatamente a que  ouvi no sonho. Em português ,  a tradução ou versão é

 “Chuva e lágrimas””.
Chuva cai e eu tão só                            

olhando a chuva, comecei a chorar
Foi tão breve o nosso amor
você sabia que iria me deixar
Fui um tolo, eu sei
me entreguei demais
Chuva cai e eu tão só
quem sabe um dia meu sol volte a brilhar

Nunca mais terei
tanta crença assim
Chuva cai, solidão
é só você que vive junto a mim
Chuva cai, onde está
quem me deixou chorando tanto assim
Chuva cai, ó meu Deus
vou chorar, até quando eu não sei


 Deixo para quem sabe interpretar, ou chutar: Por que logo  num cemitério? Por que sozinha? Não poderia ser com um amor?! Vá entender, sonho é sonho, pesadelo  não é sonho, um é bom outro é ruim.
                                   Dora Duarte (Florianópolis, 19/02/2016)

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016

O Casório da tia Fia(causo)

















A solteirona caçula irmã de minha mãe, conseguiu  finalmente arranjar um noivo, não era lá essa grande coisa, digo, um bom partido, ou um homem decente, mas,naquela idade não tinha nada que escolher... e foi chegado o grande dia do casório. Morávamos  numa cidade de outro estado, mesmo assim a nossa família foi em peso ao casamento do ano.
   Festança das boas como toda festa do interior. Meu avô matou, cabrito, porco e varias galinhas, para alimentar todos os convidados daquele povoado.
   Para nos irmãs, com a mamãe  era costureira, ela mesma  fez os vestidos de modelos diferentes, porém, do mesmo tecido, da mesma cor. Era um tecido acetinado que tinha um cheiro horrível, muito forte, cheirava a ferida descascada. As minhas irmãs e eu protestavam, reclamavam do cheiro, recusando usar o dito cujo, principalmente  era eu a pior do bando que resmungava mais.
Mamãe disse que comprara pois era o mais barato em promoção e era o que dava para vestir nós todas, para irmos de roupa nova ao casamento da tia. Combinou que quando  a gente vestisse o tal vestido, colocaria o perfume na roupa para disfarçar a catinga de ferida, assim fez.Era um perfume de aroma muito forte de uma grande empresa de cosmético conhecida,que tinha o nome de Toque de Amor"..
  Assim, fomos ao casório, com aqueles vestidos verde cintilante, parecíamos umas vaga-lumes em cima do pau-de- arara , numa carroceria do caminhão do meu tio, irmão  da noiva,rumo á capela, com aquela essência forte, essência essa que chamava atenção de todos convidados.
  Após o casório veio o retratista com àquela parafernália toda escura, mandando os noivos  primeiro para debaixo da figueira tirar o retrato de recordação, chamava-se "chapa". Logo  depois, os convidados em fila atrás uns dos outros para outra chapa, a meninada na frente.
...E a tia Fia finalmente saiu do caritó.
                 Dora Duarte
Copyright © 2011 CONTA CONTOS ENCANTADOS.
Template customizado por Meri Pellens. Tecnologia do Blogger